Nos últimos meses, o Brasil tem enfrentado eventos climáticos extremos, como enchentes no Sul e incêndios no Pantanal. Esses desastres naturais são frequentemente descritos com uma linguagem que remete ao imaginário bíblico, como inundações diluvianas e incêndios apocalípticos. Mas será que essa associação é apenas uma questão de linguagem ou reflete uma mentalidade moldada pela Bíblia?
A Bíblia hebraica surgiu em um contexto cultural onde mitologias explicavam a interação entre humanidade e natureza. Na antiga Mesopotâmia, por exemplo, mitos descreviam a criação dos humanos para servir aos deuses, organizando a terra para a agricultura e promovendo a multiplicação dos animais. A criação era vista como a superação do caos original por um mundo ordenado.
A mitologia bíblica do Gênesis foi influenciada por essas tradições, adaptando-as ao monoteísmo. O texto bíblico confere aos humanos poder sobre a natureza, como expresso em “Dominai sobre os peixes do mar, as aves do céu e todos os animais que rastejam sobre a terra”. Essa ideia gerou debates teológicos sobre o significado de “domínio”: seria subjugar a natureza ou cuidar dela como criação divina?
Historicamente, a Bíblia foi usada para justificar a exploração predatória dos recursos naturais. Durante a colonização da África e das Américas, a doutrina cristã apoiou a devastação de florestas e a exploração de espécies nativas. A industrialização também contou com a bênção religiosa, resultando na devastação das matas europeias e no uso de carvão mineral, uma fonte de energia poluente.
As narrativas bíblicas oferecem respostas ambíguas sobre a relação com o meio ambiente. O Apocalipse de João, escrito após eventos tumultuosos como a destruição de Jerusalém e a erupção do Vesúvio, apresenta visões catastróficas sobre o fim dos tempos. A interpretação de que o retorno de Jesus seria iminente surgiu no século 19, reforçando uma mentalidade de devastação da Terra.
A ideia de um fim inevitável seguido da salvação dos escolhidos pode estar incentivando a destruição do planeta. Afinal, se o fim está próximo, por que preservar? Essa questão continua a alimentar debates teológicos e a influenciar a forma como a humanidade se relaciona com o meio ambiente.
Em suma, a relação entre a Bíblia e a destruição do planeta é complexa e multifacetada. Enquanto alguns veem na Bíblia uma justificativa para a exploração, outros buscam nela uma orientação para a preservação. O desafio é encontrar um equilíbrio que respeite tanto a fé quanto a necessidade urgente de proteger o meio ambiente.